Os influenciáveis cristãos de há mil anos atrás, acreditavam existirem muitas mulheres que introduziam um peixe vivo no sexo, antes de o cozinharem e darem a comer aos maridos, para desta forma lhes inflamarem os desejos. ©Fernando Kaskais Continuar a ler Peixe Frito

O enguiço funciona como um desabafo metafísico, que serve para justificar desgraças e azares, acidente e dívidas. Os estratos sociais mais baixos, principalmente entre a população feminina, atribuem a estagnação, a pobreza e as doenças, a factores sobrenaturais como os “enguiços”, “pragas” ou “maus-olhados”. Estas superstições tornam-se extremamente eficazes enquanto escape das tensões sociais, porque as queixosas, incompreensivelmente, vêem-se a si próprias como dignas de inveja. ©Fernando Kaskais Continuar a ler Enguiços

Quem expõe a sua vida como um livro aberto, arrisca-se a que os outros o leiam e interpretem como lhes apetecer, fora do contexto, rasurem palavras, frases inteiras, ou, até, rasguem algumas páginas. Com as fotografias passa-se mais ou menos a mesma coisa, sofrem uma espécie de expropriação. Descrição e anonimato são palavras malditas nos dias de hoje. Provocar a inveja é um “desporto” global, quase tão popular como o futebol, mas, os meus contemporâneos deviam ter mais cuidado, e aprender alguma coisa com quem sabe mais sobre a vida do que aquilo que se aprende nas faculdades ou na … Continuar a ler Selfies e Mau Olhado

A doença pode ser vista como uma maldição, que contamina a realidade com a sua presença, semeando a descrença, atrasando o futuro, fazendo com que ele talvez nunca chegue. No mundo em que a doença se move não existe atrito, ela cola-se á pele, enrola-se no cabelo, e, é ácida como o hálito dos velhos. ©Fernando Kaskais Continuar a ler Maldição

As encruzilhadas são espaços extremamente carregados.  Aí, são feitas escolhas, temores e factos justapõe-se e o desconhecido mostra pela primeira vez o rosto; gente estranha, línguas estrangeiras, informações e deuses exóticos. As encruzilhadas criam zonas limiares, espaços ambíguos de transformação e ameaça, mas potentes. Ali, o Eu, encontra-se para lá dos limites do seu próprio horizonte.  ©Fernando Kaskais Continuar a ler Encruzilhadas

Quando falas defines um espaço á volta do corpo, as palavras são o prolongamento do corpo, insultos e ameaças em particular, são frases que prometem um avanço explicito do organismo; as ameaças são organismo antes do organismo. Se as souberes usar devidamente podes influenciar o orgânico, o biológico, criar actos corporais. Este é o principio das maldições.  ©Fernando Kaskais Continuar a ler Maldições

Para combater o mal há que dar-lhe contornos. Voltou-se para uma parede branca e imaginou o cancro até lhe ver as formas, os tentáculos finos, a cor escura, as mandíbulas, uma espécie de aranha invisível a roê-lo devagar. Quando o conheceu em pormenor, traçou círculos á sua volta, imobilizando-o, depois imaginou-se a vazá-lo com uma agulha aquecida em azeite fervente, até ele mirrar por completo, e depois, voltou ao principio, repetindo tudo.  ©Fernando Kaskais Continuar a ler Maligno

Podes ver cada novo conhecido, ou conhecida, como um cosmos a desbravar. É a escada dos corpos que te pode levar ao universo dos espíritos, das almas que habitam os olhares. Podes invocar orixás e caboclas, penetrar no futuro, envelhecer. Podes criar outros rituais, mistura de todos; as sessões de espiritismo e os êxtases da mediunidade, as missas negras e as imolações de animais, a decifração das mensagens e os conhecimentos umbandistas. Podes fazer tudo isto passando por cima de muita gente, mas, se o conseguires fazer sem prejudicar ninguém, na próxima existência podes ser uma pessoa superior, mulher ou … Continuar a ler Feitiços

Não me provoques, não te atrevas a menosprezar o meu verbo, basta-me dizer uma palavra, pronunciar um nome, confiar-te um segredo, e o facto de seres habitado por esse nome, que não serás capaz de soletrar, vai enlouquecer-te. Pois, já adivinhastes, sou um agente da desgraça. Há anos que teço as ruas, que cozo as estradas aos caminhos, os ribeiros aos rios, os montes ás montanhas, as árvores ao céu. Agora, que acabastes de ler isto, tens a cabeça pesada porque, no fundo da tua caixa craniana, ficou um nome, uma palavra, que está suspenso entre duas pequenas veias, e … Continuar a ler O Nome

Diz o Sábio: Ouve ó discípulo, perguntaste-me o que é a Feitiçaria. “Pois na verdade te digo… somos todos feiticeiros, pelo menos aqueles que são capazes de usar a palavra. Depois, há uns, que são mais capazes do que outros. Atenta bem nas palavras, ó discípulo, mesmo que mínimas. Elas tem consequências internas. Cada palavra mexe, interfere, com o interior do organismo: modifica as sensações, muda-as de lugar como quem muda um móvel. Há uma relação imediata entre palavra e corpo, palavra e sensação. Porém, ó discípulo, há palavras e palavras, e a arte de as saber usar. Por exemplo, … Continuar a ler O ABC da Feitiçaria

A maldição (praga) uma vez lançada torna-se um sistema orgânico que vê, que tem olhos; e ao mesmo tempo que vê, também é visto, tem os olhos do amaldiçoado a olhar para si, sem saberem o que vêem. Uma frase maldita lançada para a atmosfera torna-se também matéria, coisa animada, pois, saindo do corpo, exibe-se. Amaldiçoar, rogar pragas, é um processo de exibição e de observação. Uma praga lançada a outra pessoa, é como uma olhadela pelo canto do olho, o famoso mau-olhado. É uma ameaça que traz o seu nome. ©Fernando Kaskais Continuar a ler Maldições

A Bruxa dizia que não era ela quem embruxava, que não era ela a autora, que era uma escrava da possessão, que as suas mãos se mexiam comandadas pro uma força estranha á sua vontade, que aqueles feitiços não lhe pertenciam. Eram obtidos através de um processo extremamente doloroso em que ela servia apenas de veículo. As pragas, os maus olhados, saiam-lhe dos olhos, escorriam-lhe pelo corpo, pela cabeça, num processo mágico em que a raiva parece contornar a consciência para ser algo que sai dos dedos, como a tinta sai da ponta das canetas. Tudo isso acompanhado de uma … Continuar a ler Bruxa Sem Vassoura